Fernanda Meirelles*
No início do mês de março, foi apresentado à votação o Projeto de Lei (PL) nº 845/23 que dispõem sobre “a regulamentação da modalidade lotérica denominada apostas de quota fixa”, estabelecida pela Lei nº 13.756/18.
Referido projeto de lei é de relatoria dos Senadores Jorge Cajuru (PSB/GO) e Hamilton Mourão (Republicanos/RS) e pretende regular a modalidade lotérica de apostas de quota fixa, criada sob a forma de serviço público exclusivo da União, explorada exclusivamente em ambiente concorrencial, em todo o território nacional.
A definição de loteria de apostas de quotas fixas dada pelo PL é: “modalidade lotérica que consiste em sistema de apostas relativas a eventos reais de temática esportiva, em que é definido, no momento da efetivação da aposta, quanto o apostador pode ganhar em caso de acerto de prognóstico.”
Já eventos reais de temática esportiva: “todo e qualquer evento, competição ou ato que faça parte de competições desportivas, torneios, jogos ou provas com interação humana, individual ou coletivo, inclusive virtual, excetuados aqueles que envolvam exclusivamente a participação de menores de idade, promovidos de acordo com as regras estabelecidas por uma organização desportiva ou suas organizações afiliadas, ou de acordo com as regras de qualquer outra organização desportiva competente, cujo resultado é desconhecido no momento da aposta.”
O PL determina que a exploração desse serviço público se dará mediante autorização discricionária do Poder Executivo Federal, sem limite do número de autorizações, e será realizada por pessoas jurídicas de direito privado que ofereçam o serviço a apostadores localizados em todo o território nacional.
A autorização terá validade de 5 (cinco) anos e tem como condições para o seu deferimento: (i) o pagamento de “taxa” no valor de R$20MM (vinte milhões de reais) – corrigida anualmente pela Selic (ii) constituição de filial no Brasil (iii) comprovação de capital social e capacidade econômica/financeira suficiente para suportar a atividade realizada (iv) designação de, ao menos, um representante legal, um representante contábil, um ouvidor e um responsável por compliance estabelecidos no País.
Será vedada a concessão de autorização a clubes de futebol e entidades esportivas, bem como a cessão de direito de uso de suas denominações, marcas, emblemas, hinos e similares para a divulgação e execução da atividade de loteria de apostas por quota fixa
Entre os documentos que deverão ser apresentados juntamente com o pedido de autorização (que deverão ser redigidos em língua portuguesa) consta:
(i) a comprovação de capacidade econômica e financeira para suportar a atividade no Brasil, que deverá ser expressa pela relação entre capital social e volume máximo de apostas, nos termos de ato do regulador;
(ii) documentos que comprovem a idoneidade dos sócios controladores, diretores e representantes legais do operador.
Será de 30 dias o prazo para análise dessa documentação básica e, atendidas as respectivas exigências, o requerente será notificado para comprovar (i) qualificação técnica (ii) garantia bancária ou financeira (iii) estrutura e meios necessários para atender solicitações de autoridades competentes (especialmente fornecimento de dados) (iv) certificação internacional de seus sistemas (v) incompatibilidade ou conflito de interesse em relação a outra atividade exercidas pelo operador.
Após entrega de toda a documentação requerida, o regulador terá prazo de 60 dias para deferir, ou não, o pedido e, uma vez deferido, será exigida a comprovação do pagamento da taxa de R$20MM.
É possível a transferência da autorização concedida, porém sempre mediante nova autorização do regulador.
A norma prevê como obrigação do operador das apostas por quota fixa a promoção de ações informativas e preventivas de conscientização dos apostadores e prevenção de transtorno do jogo patológico, inclusive mediante a expedição de orientações sobre comunicação, publicidade e marketing que incorporem medidas relacionadas à promoção do jogo responsável.
Com relação à publicidade, respectivas ações deverão promover a conscientização para o jogo responsável e campanhas publicitárias deverão conter cláusulas de advertência.
O PL traz, ainda, um capítulo dedicado à prevenção à lavagem de dinheiro e financiamento ao terrorismo e proliferação de armas de destruição em massa.
Sobre o produto da arrecadação, competirá ao operador, em atendimento a atos que serão expedidos pelo Ministério da Fazenda (i) efetuar o pagamento dos prêmios (ii) recolher a contribuição para a seguridade social e valores relativos a repasses sociais previstos na legislação (iii) recolher IR incidente sobre a premiação.
Sobre o valor dos ganhos incidirá IRPF, tanto para o apostador residente no Brasil, como para o não residente.
O Banco Central do Brasil determinará regras para a implementação de mecanismos de controle destinados a evitar que as instituições financeiras emissoras de cartão de débito e crédito, bem como qualquer outra instituição de pagamento autorizem transações que tenham por finalidade a participação em jogos de azar por meio eletrônico administrados por empresa não cadastrada.
Por fim, o PL prevê também que caberá ao Ministério da Fazenda estabelecer condições e prazo (não inferior a 6 meses) para que as empresas que operam apostas no Brasil se adequem à nova regulação.
Ao que tudo indica, uma medida provisória está sendo elaborada pelo Ministério da Fazenda em que, entre outras previsões, a licença para atuar no Brasil custará R$ 30 milhões, ao invés dos R$20MM previstos no PL 845/23.
Ao contrário do que poderia ser esperado, a notícia de regulamentação da atividade de apostas esportivas deveria ser bem recebida pelo setor de jogos, na medida em que junto com a regulamentação ganha-se segurança jurídica e, pois, incremento potencial de negócios.
*sócia do Fas advogados