Júlio César Ballerini
César Augusto Artusi Babler
Introdução
Considerando presos em estabelecimentos penais e presos detidos em outras carceragens, o INFOPEN 2019 aponta que o Brasil possui uma população prisional de 773.151 pessoas privadas de liberdade em todos os regimes. Caso sejam analisados presos custodiados apenas em unidades prisionais, sem contar delegacias, o país detém 758.676 presos.
O percentual de presos provisórios (sem uma condenação) manteve-se estável em aproximadamente 33%. O crescimento da população carcerária que, de acordo com projeção feita em dezembro de 2018, seria de 8,3% por ano, não se confirmou. De 2017 para 2018, o crescimento chegou a 2,97%. E do último semestre de 2018 para o primeiro de 2019 foi de 3,89%. [1]
Prisão é o tipo de instituição social capaz de gerar, diariamente, manchetes de impacto, filmes e documentários dramáticos e opiniões dicotômicas
O argumento diuturno quando se pensa em discutir política previdenciária é que se trata de atividade governamental (“isso é coisa do governo”)
Questão central: Como efetivar o direito a educação das pessoas privadas de liberdade? A Privação do direito de liberdade também implicaria, como efeito reflexo, a privação do direito à educação?
O MEC criou a Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade (Secad) e também envolveu a sua Secretaria de Relações Internacionais para articular esse debate no âmbito do Mercado Comum do Sul (Mercosul) e da América Latina, propondo, concretamente, aos Ministros da educação presentes, no III Fórum Educacional do Mercosul, a criação de uma Rede Latino- -americana de Educação em Prisões.
Como resultado desse processo, elaborou-se o documento Educação em Serviços Penais: fundamentos de política e diretrizes de financiamento, concebido pelo Departamento Penitenciário Nacional, órgão vinculado ao Ministério da Justiça, que o tem como política de Estado para a educação em prisão (Brasil, 1995).
Fernando Salla (1999), que situa o período da construção da penitenciária do Estado, em São Paulo, entre 1900 e 1920, como o momento em que ocorre o primeiro e grande debate nacional sobre o crime, a pena e a prisão, tendo como pano de fundo as teorias lombrosianas, dominante à época.
Debate acadêmico só foi retomado no final de 1960 e início de 1970, em virtude de uma situação criada pelo regime militar no Rio de Janeiro: a de misturar, no presídio da Ilha Grande, presos comuns com presos políticos, caldo de cultura do qual emergiram os grupos organizados que hoje dominam as prisões cariocas
Até o final da década de 1970, as escolas no interior das unidades prisionais regulavam-se observando a organização da rede regular de ensino estadual. O calendário escolar, o material didático, os processos de avaliação e promoção de séries eram análogos aos do ensino destinado às crianças. [...] Em 1979 cessaram as atribuições da Secretaria de Estado da Educação de manutenção da escola nas prisões.
A mais importante dessas instituições foi a Fundação de Amparo ao Trabalhador Preso (Funap), criada em 1976 e atualmente chamada de Fundação Prof. Dr. Manoel Pedro Pimentel. A Funap como é conhecida, recebeu do governo do Estado a incumbência de cuidar da educação nos presídios paulistas e, para isso, a partir de 1979, tomou a iniciativa de realizar convênios com duas instituições que então despontavam com propostas para a educação de jovens e adultos: a Fundação Movimento Brasileiro de Alfabetização (Mobral) e a Fundação Roberto Marinho, que iniciava o programa Telecurso. Sendo então a única fundação do gênero no conjunto dos estados brasileiros, a Funap construiu sua própria experiência de educação de jovens e adultos.
No início, a organização do ensino nas prisões seguiu as diretrizes programáticas da Fundação Mobral, posteriormente Fundação Educar, no que diz respeito ao ensino de 1ª a 4ª série. Denominado Programa de Educação Básica (PEB), foi subdividido em três etapas: – PEB I, PEB II e PEB III –, caracterizando, no sistema penal, o Nível I. O ensino de 5ª a 8ª série – o Nível II – deveria estar de acordo com as diretrizes da Fundação Roberto Marinho, que pressupunham a organização de grupo de alunos por disciplinas: língua portuguesa, matemática, história, geografia, ciências e o exercício da pluridocência. Para a conclusão do Nível II do ensino fundamental, a avaliação passou a ser realizada pelo Centro de Exames Supletivos (Cesu), órgão da Secretaria de Estado da Educação, responsável pela realização dos exames oficiais de suplência em todo o Estado de São Paulo.
Essa experiência, pela primeira vez, foi colocada em debate público, tendo a participação dos educadores diretamente envolvidos e dos técnicos de planejamento da própria Funap, com uma curiosa participação de Paulo Freire e Moacir Gadotti sintetizado em três pontos: 1) as dificuldades dos educadores e da Funap em trabalhar dentro dos presídios paulistas; 2) as práticas dos educadores dentro dos presídios, inclusive a participação de monitores presos; 3) a perspectiva de construção de uma proposta para educação dentro dos presídios
De 1993 a 1995 foram escritos alguns trabalhos no meio acadêmico acerca do tema.
Fernando Afonso Salla escreveu, em 1993, o artigo Educação como processo de reabilitação; José Ribeiro Leite defendeu uma dissertação de mestrado na Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Marília com o título Educação por trás das grades: uma contribuição ao trabalho educativo, ao preso e à sociedade; Luiz Carlos da Rocha defendeu, no Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (USP), em 1994, a sua tese de doutorado “A prisão dos pobres”; Robson Jesus Rusche, então funcionário da Funap, organizou, em 1995, a publicação Educação de adultos presos: uma proposta metodológica e, em 1997, defendeu na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) sua dissertação de mestrado intitulada Teatro: gesto e atitude - investigando processos educativos através de técnicas dramáticas, com um grupo de presidiários.
O tema só foi retomado em 2001 por Roberto da Silva, com a tese de doutorado intitulada “A eficácia sócio pedagógica da pena de privação da liberdad”e, à qual se seguiram as dissertações de mestrado de Luiz Antonio Amorim (“Um dos caminhos da educação na penitenciária de Marília/SP”) e de Manoel Rodrigues Português (“Educação de adultos presos: possibilidade e contradições da inserção da educação escolar nos programas de reabilitação do sistema penal do Estado de São Paulo”) e o artigo de Selma Aragão (Educação carcerária? Uma porta de saída do inferno?).
Até então circunscrito ao Estado de São Paulo, o debate ganhou dimensão nacional com a criação da SECAD, em julho de 2004, como parte da estrutura do MEC. No SECAD foram agrupados os seguintes temas: alfabetização e educação de jovens e adultos (EJA), educação do campo, educação ambiental, educação escolar indígena e diversidade étnico-racial de 10 a 14 de julho), de um encontro nacional sobre educação no sistema penitenciário, com a participação de diretores de presídios, agentes penitenciários e chefes de disciplina, além de representantes dos fóruns de EJA dos Estados e do Departamento Penitenciário Nacional (Depen).
Através do SEMINÁRIO EUROSOCIAL DE EDUCAÇÃO NAS PRISÕES, o tema ganhou dimensões continentais, abrangendo toda a América Latina, com proposta de criação de uma Rede Latino-americana de Educação em Prisões com o objetivo de estender a todos os presos do continente o direito à educação 2006- Campanha Nacional pelo Direito à Educação, também se posicionaram publicamente sobre o tema, com manifestações em favor da remição da pena pelos estudos, as quais chegaram à Câmara dos Deputados e ao Senado Federal como reação ao cognominado pacote da segurança pública, apresentado pelo governo depois da onda de violência que atingiu São Paulo no primeiro semestre de 2006.
Aspectos do crime, da pena e da prisão
Muitos na historiologia penal, já dissertaram acerca da pena, da prisão, do criminoso, e também do crime: Cesare Beccaria (1738-1794), com sua obra Dos delitos e das penas (1959) expõe as finalidades da pena e da prisão; Cesare Lombroso (1835-1909), com a obra “O homem delinquente”, de1876, criou a frenologia, que preconizava ser possível identificar o criminoso nato; Èmile Durkheim (1858-1917), em “As regras do método sociológico” (1978), definiu o crime como normal, necessário e útil a toda e qualquer sociedade; Erving Goffman (1922-1982), em “Manicômios, prisões e conventos” (1996), revelou a dinâmica de organização e de funcionamento da prisão como uma instituição total e os danos que ela causava aos seus internos; Michel Foucault (1926-1984), na obra “Vigiar e punir” (1986), fez a crítica mais contundente à pena e à prisão, denunciando-as como mecanismos de controle social que atendem aos interesses de classe.
E as expressões populares decorrentes das teorias acima ainda são utilizadas no meio do povo, tais como “prender e jogar a chave fora”, “lugar de criminoso é na cadeia” ou “filho de peixe, peixinho é”.
Ainda hoje temos expressões retrógradas manifestadas inclusive pelos dirigentes da nação, no sentido de endurecimento das condenações, da adoção da pena de morte, da aplicação do trabalho forçado, da construção de prisões em ilhas, selvas e lugares isolados coexistência de concepções contraditórias ou divergentes acerca da função da pena e da prisão, o que compromete sobremaneira o entendimento acerca da educação na prisão.
O Estado privilegia a punição; nos regimentos disciplinares, ao dar ênfase à segurança e à disciplina; na arquitetura prisional, por não conceber o espaço prisional em suas possibilidades educativas; na organização administrativa, que subordina a educação, a assistência social e o tratamento psicológico às ciências jurídicas; e nas práticas judiciárias, que ignoram outras formas de punição que não o encarceramento. (SILVA, 2010, p.208).
A Sociedade introduz punições cada vez mais rigorosas aos crimes e a cada ano, aumenta o preconceito que devota a quem sai da prisão, contrabalanceada com o desejo contraditório de eficácia por parte das instituições penais na reabilitação.
Há, em síntese, uma visão deturpada a respeito da prisão e da sua função social.
Afrodescendentes nos países que passaram pela experiência escravagista, índios, mestiços nos países de língua espanhola e brancos pobres nos países de maior miscigenação racial, como é o caso do Brasil, compõem a maioria da população prisional, com participação cada vez mais crescente de adolescentes e mulheres. (SILVA, 2010, 209)
Conforme Adorno, a prisão está cada vez mais destinada a pessoas de extratos sociais historicamente mais vulneráveis, das quais se negligenciou a educação pelas instâncias tradicionais de socialização, como a família, a escola, a igreja e o mercado de trabalho. (ADORNO)
A exclusão social dos jovens faz da prisão o espaço que lhes forje o caráter e a personalidade. Algumas alternativas possíveis são a desjudicialização dos crimes contra o patrimônio, como furto, roubo, apropriação indébita e estelionato, para a esfera das relações de consumo; ou a descriminalização dos crimes contra a honra, como ofensa, calúnia e difamação, justificando sua indicação para instâncias de mediação no âmbito da sociedade civil, sem se desconsiderar a “ultima ratio” da esfera penal, ou seja, a intervenção penal deve se dar no patamar mínimo necessário à subsistência do Estado, quando as demais esferas jurídicas não forem adequadas ou suficientes a reparar o dano ao interesse protegido pela norma. Em contrapartida, alguns crimes como os “crimes do colarinho branco”, praticados por organizações criminosas, muitas vezes até de caráter governamental, restam impunes por falta de investigação ou insuficiência de provas em razão da demora excessiva da sua conclusão, quiçá intencional. E por isso, constituem a “cifra negra” do crime. Ademais, o combate à corrupção e aos crimes praticados contra a Administração Pública, deve continuar como bandeira a ser levantada pelos cidadãos, enquanto substituir o Estado Democrático de Direito.
Adamais, ainda que se figure na linha do Direito Penal, há penas alternativas à prisão no caso de crimes de menor potencial ofensivo e que deverão ser efetivadas e aplicadas em caráter preferencial à prisão.
CAPÍTULO 2. A contribuição da educação para a reabilitação penal
As pesquisas têm demonstrado que a experiência precoce da punição é um fator de retroalimentação da reincidência carcerária (Adorno, 1991; Silva, 1998).
No aspecto do trabalho, a remuneração não representa um justo pagamento pela força de trabalho utilizada, não há qualquer preocupação para a construção de uma cultura do trabalho e o peso do preconceito pelos antecedentes criminais quase que eliminam as chances de um emprego formal com benefícios sociais e trabalhistas adicionais
No campo da educação, programas educativos em estabelecimentos penitenciários são inadequados, de baixa Qualidade e de pouca frequência por um único motivo: incompatibilidade dos objetivos e das metas da educação com os da pena e da prisão.
Conforme o autor, não há incompatibilidade epistemológica (dificuldade do conhecimento pela hostilidade do ambiente ou da violência constante praticada) nem metodológica. Segundo Paulo Freire (1995) e Moacir Gadotti (1993) a pretensão de se criar um método exclusivo ou próprio para a educação de presos só acentuaria a sua discriminação.
Há incompatibilidade conceitual, eis que enquanto se considerar a prisão como espaço de confinamento, de castigo, de humilhação e de estigmatização social, a educação não terá lugar na terapia penal, limitando-se a ser, como efetivamente é, apenas mais um recurso a serviço da administração penitenciária para ocupar o tempo ocioso de alguns poucos presos e evitar que se envolvam em confusões. (SILVA, 2010, p. 213 )
A terapia penal requer condições que favoreça o afloramento de habilidades dos domínios cognitivo, afetivo, psicomotor e da sociabilidade e que precisam, posteriormente, ser continuamente exercitadas.
A solução deveria se dar sob diversos enfoques:
- Do ponto de vista arquitetônico, a prisão deve diminuir a sensação de confinamento que lhe é característica, provocando alienação em relação ao tempo e ao espaço e rupturas com os símbolos de referência que organizam a estrutura afetiva e emocional do preso.
- Quanto à segurança, ela deve ser garantida para quem está dentro da prisão, e não apenas a segurança externa da sociedade, pois essa sensação de insegurança do preso se traduz em percepção de injustiça, de inconformidade com a pena aplicada e de desejo de vingança pelas humilhações sofridas.
- Sob a ótica disciplinar, esta deve favorecer o estudo, a reflexão crítica, o debate de ideias e a problematização da condição existencial do preso, e não apenas focalizar a obediência, a submissão e o exercício da autoridade (SILVA, 2010, p.214)
REMISSÃO DA PENA: UMA ANÁLISE AMPLIATIVA
Como visto, resta como muito importante que se faça a diferenciação entre as palavras remição e remissão, pois parônimas poderão levar ao uso indevido no vocábulo (na ciência jurídica há criação de um verdadeiro idioma próprio, autores como Celso Campilongo apontam no sentido de que haveria um senso comum próprio dos operadores do direito – pequenas variações podem alterar muito o alcance e extensão de um instituto), eis que:
- remição: do latim: redimire – adquirir de novo, resgatar, compensar. [1]Assim, é de se presumir que pelo trabalho e/ou estudo o preso estará compensando os dias de pena que serão descontados de sua condenação. É o direito de resgatar a liberdade, adquiri-la novamente e em tempo antecipado;
- remissão: do latimremissio, de remittere – perdoar, renunciar, desistir, absolver. [2]
Nesse sentido, valeria à pena destacar:
“A palavra remição vem de redemere que no latim significa reparar, compensar, ressarcir. É preciso não confundir remição com remissão; esta, segundo o léxico, significa a ação de remir, perdoar. Na lição de Júlio F. Mirabete, pode-se definir a remição, nos termos da lei brasileira, como um direito do condenado em reduzir pelo trabalho prisional o tempo de duração da pena privativa de liberdade cumprida em regime fechado ou semiaberto. Trata-se de um meio de abreviar ou extinguir parte da pena”.(Marcão, 2.007, p. 163)[3]
Mesmo na seara do que se chama o “cível” (ramo não penal e não trabalhista da atividade jurídica) tais parônimas geram confusão em sede de direitos obrigacionais, eis que a remição tem referência a um resgate efetuado na execução quando do pagamento pelo executado, enquanto a remissão tem seu aspecto bilateral de perdão (sim, no âmbito cível tal instituto é bilateral, comportando aceitação pelo perdoado – para que não houvesse necessidade de aceitação, deveria o interessado se valer da renúncia, essa ato unilateral).
No âmbito penal, objeto do presente estudo, remição tem sua origem no Direito Penal espanhol - “redenção de penas pelo trabalho”. [4] Foi destinada primeiramente aos presos políticos da Guerra Civil e mais tarde abrangeu delitos comuns. A partir de 1995 o Código Penal espanhol suprimiu a remição da pena pelo trabalho com o objetivo de “aproximar a pena real da pena nominal”. [5]
No Brasil, o Conselho Nacional de Justiça regulamentou as normas para uniformizar o regramento da remissão, com base na LEP (Lei de Execuções Penais) e nas normas inferiores à lei (como portarias e decretos).
A remição de pena, prevista na Lei n. 7.210/84 de Execução Penal (LEP), está relacionada ao direito assegurado na Constituição Federal de individualização da pena. Dessa forma, as penas devem ser justas e proporcionais, além de particularizadas, levando em conta a aptidão à ressocialização demonstrada pelo apenado por meio do estudo ou do trabalho.
- DA REMISSÃO PELO TRABALHO
No Brasil, a LEP (Lei de Execução Penal) previa originariamente, a remissão pelo trabalho. Referida modalidade de remição encontra-se no artigo 126 da Lei de Execução Penal e restringe a remição pelo trabalho, aos regimes fechado e semiaberto. O trabalho do preso poderá ser executado tanto dentro do estabelecimento prisional, quanto de forma externa.
O trabalho interno do preso, consiste em auxiliar na cozinha, tanto dos agentes da casa prisional quanto na cozinha dos próprios presos, cuidar de eventual horta que o presídio possua, fazer serviços de limpeza, entre outros. Por outro lado, o trabalho externo, pode ser qualquer trabalho que o preso consiga, como por exemplo, de pedreiro, frentista, vendedor, e até mesmo autônomo como microempreendedor individual.
A vantagem da remissão é o desconto de 1 dia de pena a cada 3 dias de trabalho.
Frisa-se, no entanto, que não se trata de mero abatimento por ter o preso estudado, mas o tempo remido deverá ser computado como sanção penal que foi cumprida de forma efetiva pelo condenado. O tempo remido será também computado para se conceder o livramento condicional e o indulto.
- REMISSÃO DA PENA PELO ESTUDO
As possibilidades de remição de pena foram ampliadas pela Lei n. 12.433, de 2011, que alterou a redação dos artigos 126, 127 e 128 da Lei de Execução Penal e passou a permitir que, além do trabalho, o estudo contribua para a diminuição da pena. A ressocialização do preso é uma preocupação constante do CNJ, que incentiva iniciativas voltadas à redução da reincidência criminal.
No contexto da remissão pelo estudo o seu desenvolvimento ocorreu de forma precoce em países vizinhos, da América Latina. A redução da pena mediante a frequência a aulas, cursos e outras formas de estudos e de aprendizagem pode ser uma forma eficaz de introduzir os objetivos educacionais como parte integrante da terapia penal
Na Venezuela, a remição pela educação é uma realidade desde a promulgação da Ley de redención judicial de la pena por el trabajo y el estudio, de 1993
A Colômbia, da mesma forma, reconhece a remição da pena pelos estudos (artigo 97 do Código Penitenciário de 1933)
“A los detenidos y a los condenados se les abonará um día de reclusión por dos días de estudio. Se computará como un día de estudio la dedicación a esta actividad durante 6 (seis) horas, así sea en días diferentes (Colômbia, 1993).”
No Uruguai, existe una política pública em matéria de educação na prisão, iniciada a partir da aprovação da Lei nº 17.897, que prevê a criação de mecanismos de “redención de pena por estudio”, nos mesmos limites da Colômbia. (SILVA, 2010, p. 216)
A origem do projeto de lei que previa a remissão se deu pela apresentação pelo então senador Cristovam Buarque PTB/DF com apoio do Ex-Ministro da Educação (2012-2014) Aluízio Mercadante, do partido dos Trabalhadores PT/SP).
A remição por estudo garante que o condenado que cumpre a pena em regime fechado ou semiaberto pode remir um dia de pena a cada 12 horas de frequência escolar, caracterizada por atividade de ensino fundamental, médio, inclusive profissionalizante, superior, ou ainda de requalificação profissional. De acordo com a Recomendação n. 44 do CNJ, para fins de remição por estudo deve ser considerado o número de horas correspondente à efetiva participação do apenado nas atividades educacionais, independentemente de aproveitamento, exceto quando o condenado for autorizado a estudar fora do estabelecimento penal. Neste caso, o preso tem que comprovar, mensalmente, por meio de autoridade educacional competente, tanto a frequência, quanto o aproveitamento escolar.
As atividades de estudo podem ser desenvolvidas de forma presencial ou pelo Ensino a Distância (EAD), modalidade que já é realidade em alguns presídios do país, desde que certificadas pelas autoridades educacionais competentes. A norma do CNJ possibilita também a remição aos presos que estudam sozinhos e, mesmo assim, conseguem obter os certificados de conclusão de ensino fundamental e médio, com a aprovação no Exame Nacional para Certificação de Competências de Jovens e Adultos (ENCCEJA) e no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), respectivamente.
A remissão por leitura assegura ao preso a possibilidade de remir a pena por meio da leitura e já é realidade em diversos presídios do país. De acordo com a Recomendação n. 44 do CNJ, deve ser estimulada a remição pela leitura como forma de atividade complementar, especialmente para apenados aos quais não sejam assegurados os direitos ao trabalho, educação e qualificação profissional. Para isso, há necessidade de elaboração de um projeto por parte da autoridade penitenciária estadual ou federal visando a remição pela leitura, assegurando, entre outros critérios, que a participação do preso seja voluntária e que exista um acervo de livros dentro da unidade penitenciária. Segundo a norma, o preso deve ter o prazo de 22 a 30 dias para a leitura de uma obra, apresentando ao final do período uma resenha a respeito do assunto, que deverá ser avaliada pela comissão organizadora do projeto. Cada obra lida possibilita a remição de quatro dias de pena, com o limite de doze obras por ano, ou seja, no máximo 48 dias de remição por leitura a cada doze meses. [2]
Para que seja concedido o benefício da remissão, é bem clara a Lei de Execução Penal que em seu artigo 66, III, c, determina que o juiz deverá dar a declaração ouvindo previamente o Ministério Público com as devidas comprovações do trabalho e/ou estudo encaminhadas pela autoridade administrativa ao Juízo da Execução.
A presente lei tem regras de natureza material porque trata especificamente do cumprimento de pena de prisão. Aplica-se em benefício do preso e é de direito intertemporal, ou seja, contem disposições para que possa ser aplicada de forma retroativa. Como visto no conceito de remição, de se aplicá-la em benefício daquele que estando a cumprir pena em regime fechado ou semiaberto, que poderá obter um dia de pena de prisão remido para cada três dias de trabalho ou dias ocupados com estudos, ou ambos concomitantemente.
Coloca-se aqui um exemplo para tornar mais clara a visualização do benefício: O preso estudou por 900 dias, terá remido 300 dias, mas durante o cumprimento da pena acabou se formando, então, ganhou mais 1/3, ou seja, seus dias remidos passaram para 400 dias. A remição por estudo é mais ampla que a remição por trabalho já que permite ao preso estudar estando nos regimes fechado, semiaberto e aberto e ainda no livramento condicional. A remição por trabalho é admitida apenas em regime fechado e semiaberto.
A autoridade responsável pelo presídio deverá informar mensalmente ao juiz quanto às horas trabalhadas e/ou estudadas pelo presidiário e este, em estudando fora do presídio, deverá comprovar sua frequência através de declaração do estabelecimento de ensino que frequenta. É importante ressaltar que a lei não se esqueceu do respeito que se deve ao preso devendo mantê-lo informado, através de relação, os dias remidos.
Presídios não deixam de ser instituições totais (porque não totalitárias na acepção em que Hannah Arendt empresta ao termo no seu clássico “As origens do Totalitarismo” – lá direitos fundamentais são excepcionados e quando se restringem direitos mais se avança no totalitarismo – se consentido pela ordem constitucional ou se de modo necessário ou não seria objetivo de estudo de outro artigo de cunho sociológico. Mas em ambientes como este a educação verdadeira no sentido do “ex ducere” seria verdadeiramente um bálsamo reparador se houvesse investimento estatal ou preocupação com o setor – não há preocupação efetiva com a questão da solidariedade social que veda processos de exclusão e marginalização social – artigo 3º e seus consectários CF.
Outra novidade introduzida na lei, mas que tem sido pouco utilizada pelos criminalistas é que estando o preso em regime aberto e no livramento condicional poderá também, através de estudo remir sua pena (a preocupação maior dos operadores é tirar o processo da Cadeia, infelizmente e não em recuperá-lo – isso se nota pela baixa incidência prática deste dispositivo – às mais das vezes utilizados nos “White collars crimes” – crimes do colarinho branco em que os réus já são escolarizados). Nesse sentido:
“Art. 126. O condenado que cumpre a pena em regime fechado ou semiaberto poderá remir, por trabalho ou por estudo, parte do tempo de execução da pena [...] § 6º O condenado que cumpre pena em regime aberto ou semiaberto e o que usufrui liberdade condicional poderão remir, pela frequência a curso de ensino regular ou de educação profissional, parte do tempo de execução da pena ou do período de prova, observado o disposto no inciso I do § 1º deste artigo. [...] § 1º A contagem de tempo referida no caput será feita à razão de: I – 1 (um) dia de pena a cada 12 (doze) horas de frequência escolar – atividade de ensino fundamental, médio, inclusive profissionalizante, ou superior, ou ainda de requalificação profissional – divididas, no mínimo, em 3 (três) dias” (Brasil, 2012)[6].
De se ver aqui que somente se trata de questão referente à remição de parte da pena por estudo. Ainda analisando o artigo 126, é de bom termo que se saiba que o preso deverá cumprir no mínimo 6 horas de trabalho diário (podendo chegar a oito), mas no máximo de 3 (três) dias e com relação aos estudos, no máximo 4 (quatro) horas por dia distribuídas em 3 (três) dias.
Teoricamente é bem possível a cumulação trabalho/estudo nos mesmos dias, pois nada impede que o preso trabalhe por 6 horas durante o dia e estude por 4 horas no período noturno. Cabe ao diretor do presídio providenciar a compatibilidade dos horários. Tem-se com isto que o preso em um único dia poderá conseguir remição pelo trabalho e pelo estudo. Serão assim dois dias de remição conseguidos em um só dia. Sobre o tema, inclusive, de se louvar o entendimento manifesto pelo Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais que reconheceu a possibilidade de tal benefício:
TJ-MG - 100000848359900011 MG 1.0000.08.483599-0/001 (1) (TJ-MG) Data de publicação: 22/04/2009 Ementa: AGRAVO EM EXECUÇÃO. CRIME HEDIONDO PRATICADO ANTES DA LEI 11.464 /07. PROGRESSÃO EM 1/6. IRRETROATIVIDADE DA LEI POSTERIOR MAIS SEVERA. APLICAÇÃO DO ART. 112 DA LEI DE EXECUCOES PENAIS. TRABALHO E ESTUDO REALIZADOS NO MESMO PERÍODO. REMIÇÃO CONCEDIDA POR AMBAS AS ATIVIDADES. POSSIBILIDADE. - De acordo com o majoritário entendimento do TJMG, perfilhando o posicionamento adotado pelo STF e STJ, os condenados por crimes hediondos praticados antes da entrada em vigor da Lei 11.464 /07 fazem jus à progressão de regime com o cumprimento de 1/6 (um sexto) da pena. - Não há óbice legal à concessão da remição pelo trabalho e estudo desempenhados em um mesmo período, desde que respeitados os limites estabelecidos pelos artigos 33 e 126, § 1º, da Lei de Execução Penal, forma essa de se viabilizar a reinserção do condenado na comunidade, através da maior qualificação intelectual.
Chama-se a atenção para o detalhe que no caput do artigo 126 cuida de estudo dentro do presídio quando se tratar de cumprimento de pena em regime fechado e no semiaberto do caput ou na situação do art.126, § 6º, que cuida de estudo fora do presídio. O art. 126, §4º foi ampliado para poder atender o preso tanto com relação a trabalho como também estudo, tal como se observa pela transcrição literal do referido consectário: “§ 4º O preso impossibilitado, por acidente, de prosseguir no trabalho ou nos estudos continuará a beneficiar-se com a remição” (Brasil, 2012).[7]
Há neste parágrafo uma observação a ser feita, ou seja, se o preso provocar o acidente, havendo a intenção de se beneficiar da lei estando parado, perderá parte do que já conseguiu remir. O art.126, §5º acaba por beneficiar ainda mais o preso, tratando-se de uma sanção premial, em que acaba ganhando mais 1/3 (um terço) em cima dos dias que já conquistou:
“§ 5º O tempo a remir em função das horas de estudo será acrescido de 1/3 (um terço) no caso de conclusão do ensino fundamental, médio ou superior durante o cumprimento da pena, desde que certificada pelo órgão competente do sistema de educação”.[8]
A intenção das modificações e acréscimos feitos na Lei de Execução Penal é com o intuito de ressocializar a pessoa, dar-lhe a oportunidade de sair do cárcere com maiores condições de enfrentar o mercado de trabalho e até mesmo de aprimorar-se nos estudos. Vale destacar o quanto apontado por Renato Marcão, citado por Adeildo Nunes, em valiosa lição a respeito da questão:
Renato Marcão assegura que “a assistência educacional tem por escopo proporcionar ao executado melhores condições de readaptação social, preparando-o para o retorno à vida em liberdade de maneira mais ajustada, conhecendo ou aprimorando certos valores de interesse comum. É inegável – diz Marcão – ainda, sua influência positiva da manutenção da disciplina do estabelecimento prisional” (Nunes, 2012, p. 70).[9]
Importante ressaltar que o art. 126, § 7º oportuniza as mesmas condições ao preso cautelarmente, ou seja, antes mesmo do trânsito em julgado da sentença. E com a redação do § 8º do mesmo dispositivo legal, percebe-se que a lei está privilegiando o contraditório e a ampla defesa. De acordo com o parágrafo 8º, havendo falta grave, o juiz poderá revogar até 1/3 (um terço) do tempo remido. Antes, de acordo com a Súmula Vinculante 9 do STF, o preso perdia o direito a todos os dias remidos por que a mesma reconheceu a constitucionalidade do artigo 127 da Lei 7.210/84.
No entanto, vale destacar que se cuida de Súmula Vinculante editada antes do advento da Lei nº 12.433/11, logo, nessas condições, referida Súmula deverá ter seu conteúdo reavaliado.
O juiz deverá analisar caso a caso de acordo com os critérios do artigo 59 da LEP (“Art. 59: Praticada a falta disciplinar, deverá ser instaurado o procedimento para sua apuração, conforme regulamento, assegurado o direito de defesa - parágrafo único. A decisão será motivada”).[10]
Isso chega a ser pleonástico em nossa democracia participativa que, nos termos do advento da EC 45/04 já previu o dever de motivação de todas as decisões judiciais, ainda que administrativas, ou seja, vai-se muito além do mero provimento (artigo 93, incisos IX e X CF).
Se a lei tem função ressocializadora, nada mais correto que o magistrado avaliar o conjunto de situações que levaram o preso a transgredir as regras impostas pela penitenciária. A remição deve ser considerada como pena cumprida, segundo disposição contida no artigo 128 da referida Lei pátria de Execução Penal.
Há a oportunidade do ensino à distância quando o regime for fechado e presencial, nos casos em que for possível ao presídio acompanhar o preso até a instituição de ensino.
A POLÊMICA DA REMISSÃO PARA OS CRIMINOSOS HEDIONDOS
Questões nitidamente ideológicas permeiam o direito penal e sempre que vem à baila alguma modificação deste arcabouço penal, inúmeros detratores dos benefícios dos presos eclodem à primeira luz com críticas, notadamente no que se refere à restrição de tais benefícios em casos de prática de crimes hediondos ou a eles assemelhados, cuidando-se de questões que geram inúmeras polêmicas no seio social e que, nessas condições, autoriza alguns comentários no presente trabalho. Isso é fruto do mesmo preconceito gerado pela cultura de guerra ao crime e sua apologia, cujas matizes não podem ser analisadas em tão breve artigo, escapando de sua finalidade. Busca-se, no entanto, a retirada de aspectos ideológicos da questão, pretendendo-se uma análise técnica.
Não houve por parte do legislador infraconstitucional a preocupação em conceituar o que seria crime hediondo, ao invés disto, deixou claro que crimes hediondos são todos aqueles elencados no Código Penal ou em lei especial, o que acabou sendo motivo de discussões, pois da forma colocada “não é hediondo o delito que se mostre repugnante, asqueroso, sórdido, depravado, abjeto, horroroso, horrível”[12] no dizer de Vicente Amêndola. Afirma que essa insuficiência de uma conceituação apropriada acaba provocando distorções e injustiças quando o juiz vai aplicar a sentença, pois se trata de lei muito abrangente.
Se perguntarmos a qualquer do povo o que seria um crime hediondo, obteremos certamente expressões como estas: o crime que é cometido de forma brutal; o que causa indignação às pessoas quando dele tomam conhecimento; o que é sórdido, repugnante [...] ‘Não podemos criticar esse entendimento leigo,
Ele revela, de fato, o significado da palavra hediondo, quando entendida em seu conteúdo qualificativo. Aurélio, em seu dicionário, informa-nos que o vocábulo origina-se do espanhol, significando ‘repelente, repulsivo, horrendo’. Caldas Aulete, por sua vez, diz que ‘hediondo é aquele que manifesta extrema abjeção ou desaprovação nos seus atos; que inspira pelos seus vícios ou crimes repulsa e horror [...]’ ‘Teríamos assim um crime hediondo toda vez que a conduta delituosa estivesse revestida de excepcional gravidade, seja na execução, quando o agente revela total desprezo pela vítima, insensível ao sofrimento físico ou moral a que a submete, seja quanto à natureza do bem jurídico ofendido, seja ainda pela especial condição das vítimas. No direito penal brasileiro o termo hediondo não havia sido empregado até que a Constituição de 1988, como vimos, no seu art. 5º, XLIII, se utilizasse da expressão crimes hediondos, remetendo à legislação ordinária a tarefa de defini-los. É que, apesar de a hediondez, como conduta humana, ser de fácil entendimento, não precisando de definição, no momento em que é erigida à categoria de qualificativo de um delito, por força do princípio da reserva legal, torna-se imperativo que haja uma tipificação legal. Assim é que o próprio texto constitucional, no inciso citado, diz que hediondos serão os crimes definidos em lei. Nasceu assim a Lei de nº 8.072 de 25 de julho de 1990, como resposta ao ordenamento constitucional. Dessa forma, crime hediondo será única e exclusivamente aquele que esta lei, já chamada de Lei dos Crimes Hediondos, assim o disser.(Monteiro, 1.995, p. 15-16)[13]
Inicialmente, na Câmara dos Deputados o texto do PL 7.824/2010, recebeu emenda que proibia a remição de pena pelo trabalho ou pelo estudo aos condenados por crimes descritos em lei como hediondos e aos que a eles se assemelhavam. Esse texto foi convertido posteriormente na Lei 12.433, de 29 de junho de 2011.
Ocorreu que tal emenda desatendia o ideal ressocializador que deveria ser o objetivo principal da prisão e, também, tratava-se de uma inconstitucionalidade. Se o objetivo é ressocializar, com mais razão se deve tentar ressocializar quem tem maiores dificuldades de ressocialização, o que se pressupõe em relação a quem pratique crimes mais graves.
A lógica do raciocínio é simples, eis que penas não mais podem ser vistas como vinganças sociais, como apontado no início do presente trabalho, mas como formas de ressocialização do indivíduo.
Seria miopia legislativa querer dizer o contrário, o que confrontaria a própria proporcionalidade que se espera dos atos do Poder Público, como pode ser extraído dos princípios do artigo 37 da Constituição Federal. Assim, acabou por não vingar a restrição e todas as regras quanto à remição pelo trabalho e pelo estudo são aplicáveis a todos os condenados, sejam eles condenados por crimes comuns, hediondos ou assemelhados, sem restrições.
CONCLUSÃO
Atualmente, inobstante toda a evolução doutrinária e da tecnologia do ensino, o cenário ainda é ruim, considerada a dificuldade prática em sua implementação. Para isso, a Lei de Execução Penal (LEP) e suas alterações abarca, obrigatoriamente, a instrução escolar de ensino fundamental, médio e Educação de Jovens e Adultos. Prevê, ainda, a educação profissional em nível de iniciação ou aperfeiçoamento técnico, a educação a distância, e a estruturação de bibliotecas. Essas ações educativas devem estar articuladas à administração estadual e municipal de educação, e agregadas ao preceito do sistema de justiça ou administração penitenciária e revertidas para fins de remição de pena dos custodiados. Entretanto, parece não haver interesse no investimento na educação dos presos, tanto pelo Poder Executivo quanto pelo Judiciário.
Ademais, onde existe escola em ambiente prisional, ela não é incentivada. As escolas em ambientes prisionais atendem, em média, apenas 11% da população dos privados de liberdade (DEPEN, 2015). [3]
Acredita-se que, se o preso tiver disposição para o estudo e o Estado não puder lhe dar condições de estudar, estará ocorrendo cerceamento de direito de pessoa encarcerada, sujeitando-se o infrator às sanções legais, mormente, até mesmo, no Juízo Cível, ação indenizatória sob a perspectiva da teoria da perda de uma chance.
As Defensorias Públicas certamente estarão atentas a isso. Aliás, demonstra a prática que o melhor modo de fazer o Estado cumprir políticas públicas se revela a partir das condenações pecuniárias. Demorará a se formar o primeiro precedente, mas a partir dele o Estado entenderá que o melhor caminho será a adequação de sua postura aos termos da lei, cumprindo-se, em última análise, preceitos referentes à dignidade da pessoa humana (artigo 1º CF) e solidariedade social (art. 3º da mesma Carta Política).
Quando as pessoas assim consideradas “livres” fazem as contas somando-se a remição por trabalho e estudo, e considerando ainda 1/3 se houver acabado o curso, tem-se que o temor torna-se inevitável ao leigo. Ainda mais porque vivemos numa cultura de guerra ao crime, com policiais e promotores guerreiros e uma mídia que supervaloriza o crime em caráter sensacionalista.
Essa mesma sociedade deveria perceber que se o preso está estudando e sendo qualificado, as condições para que torne a delinquir diminuem, o que é maliciosamente oculto pela mídia e por setores não tão bem-intencionados. Isso não dá tanto IBOPE quanto noticiar delitos sangrentos.
No entanto, para que tais argumentos pudessem ter alguma validade, as cadeias deviam recuperar os encarcerados, mas como apontado acima, com fundamento em Augusto Thompson, essa, infelizmente, não é a realidade, não se prestando o encarceramento à ressocialização (Thompson, 1.998, p. 96).
E o que hoje vemos como utopia, quiçá daqui alguns anos veremos como realidade eficaz, na busca de uma sociedade livre, justa e solidária, almejada pelo constituinte originário ao insculpir a Constituição de 1988.
BIBLIOGRAFIA
Roberto da Silva- Revista de Ciências da Educação. Centro Universitário Salesiano de São Paulo – UNISAL. Programa de Mestrado em Educação. – Americana, SP, n. 1 (1999)- Ano XII, nº 22 (1º Semestre de 2010).
[1] https://www.novo.justica.gov.br/news/depen-lanca-paineis-dinamicos-para-consulta-do-infopen-2019
[3] TORRES, ELI NARCISO DA SILVA. A gênese da remição de pena pelo estudo: o dispositivo jurídico-político e a garantia do direito à educação aos privados de liberdade no Brasil- Campinas, SP:2017- Orientador: Ana Maria Fonseca de Almeida. Tese (doutorado) - Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Educação, p. 214.