Escola-Base Verde: Exportadora prova não ter cometido crime ambiental, mas está falida

Atividade sustentável de extração de cascas de pau-pereira no Pará foi autuada em 2005 e ganhou as manchetes como biopirataria; Escritório de Direito Ambiental do Paraná provou que licença exigida pelo IBAMA não era obrigatória

Sucessão de erros do IBAMA durante fiscalização de exportação de cascas de de pau-pereira em 2005 levaram a autuação e condenação pública de uma empresa que fazia extração sustentável do subproduto dessa madeira no Pará. Esta semana, dezesseis anos depois, com a exportadora já falida, o escritório de Direito Ambiental Pineda & Krahn (PEK), sediado em Curitiba, finalmente conseguiu retirar a obrigação da empresa de pagar indenização de R$ 3 milhões ao Meio Ambiente. As advogadas já haviam conseguido anular o auto de infração em 2016 e agora zeraram a cobrança, considerada indevida e que estava sendo exigida da S R GALVES Participação e Importação LTDA.

A decisão foi do Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF-5). Ainda cabe recurso, mas as advogadas Manoele Krahn e Luiza Furiatti, especialistas em Direito Ambiental que conduziram os processos, consideram esta terceira decisão uma vitória difícil de contestar. “Foram longos anos de muita angústia, muitas discussões e audiências. A autuação do IBAMA foi objeto de ação judicial totalmente acompanhada pelo PEK”, explica Manoele Krahn. 

Após avaliar a apelação cível em 2016, a  juíza federal Sílvia Regina Salau Brollo já havia considerado procedente o pedido e condenado o IBAMA ao pagamento das custas processuais e honorários sucumbenciais, fixados em 10% sobre o valor da causa. No ano anterior, a denúncia criminal aberta contra a proprietária da empresa, Sandra Galves Rosa, também foi considerada improcedente pelo juiz Danilo Fontenelle  Sampaio, que absolveu a acusada. “Em 2016, foi proferida sentença que reconheceu a ilegalidade do auto de infração. No processo crime o entendimento foi o mesmo e a empresa foi absolvida de todas as alegações”, reforça a advogada Manoele

Escola-Base Verde

O caso da Escola-Base ficou conhecido nos anos 90 como símbolo dos efeitos destrutivos de julgamentos midiáticos. No evento em questão, uma escola particular infantil no bairro da Aclimação, em São Paulo, foi acusada por duas mães de abuso sexual. Os proprietários, um motorista de transporte escolar e um casal de pais foram inocentados ainda na fase de inquérito policial, mas já haviam sido expostos nacionalmente e perderam tudo. 

No caso da S R Galves, a situação teve início com a apreensão de 15 toneladas de raspa da madeira de pau-pereira, que seriam exportadas para os Estados Unidos. A apreensão foi amplamente divulgada pela mídia na época, que acusou a empresa de praticar biopirataria.

Segundo o Ministério Público e o IBAMA, a empresa precisaria de autorização do Conselho de Gestão do Patrimônio Genético (CGPG) para a exportação. O IBAMA autuou a S R Galves em R$1,5 milhão e a proprietário respondeu processo criminal e enfrentou ação civil pública (ACP) que buscava a reparação dos danos ambientais causados pela falta da autorização.

“O próprio CGEN chegou a se manifestar formalmente, várias vezes, no sentido de que não era necessária autorização para a exportação realizada. O IBAMA manteve a multa e o Ministério Público insistiu na irregularidade da conduta”, relembra a advogada Manoele Krahn. 

A sentença da ACP havia condenado a empresa ao pagamento de aproximadamente R$ 3 milhões a título de indenização pelos danos ambientais. O Pineda & Krahn apelou da decisão e, no julgamento desta semana, o TRF5 cancelou a condenação em indenização, dando provimento à apelação. “Era uma atividade totalmente sustentável, que oferecia oportunidades a uma comunidade do Pará e que foi totalmente inviabilizada por uma atuação equivocada pelo IBAMA. A empresa faliu e hoje não tem perspectivas de retornar à atividade”, lamenta Manoele.

Nem toda madeira é ilegal

A urgência climática dada pelo aquecimento global tem agravado a polarização nas questões ambientais. Meio Ambiente e Agronegócio, muitas vezes, são colocados na mídia como antagonistas, quase sempre com a produção humana como vilã. O que especialistas em Direito Ambiental, entretanto, defendem é que os dois segmentos trabalhem juntos para uma captação maior de carbono e proteção de florestas.

No caso da  S R Galves, a empresa relatou no processo que foi procurada pela Natural Source, que lhe trouxe a proposta de desenvolvimento de um projeto de extrativismo sustentável com a casca de pau-pereira (utilizado no Pará como digestivo). A proprietária dirigiu-se então até as comunidades, onde realizou reuniões e orientou pessoas, organizando um sistema para coleta, transporte, armazenamento e preparo das cascas para exportação. A extração não causa qualquer dano à árvore e, em poucos meses, a casca se refaz, assegurando um extrativismo absolutamente sustentável. O material seria enviado para produzir complemento alimentar nos EUA, não para medicamento, e seria a primeira exportação da empresa. 

A representação das comunidades locais solicitou ao IBAMA informações sobre como proceder com a nota fiscal e o órgão concedeu a ATPF nº 0136772 com tarja laranja, que representava transporte de palmito e não de pau-pereira. Ao solicitar as liberações portuárias de praxe à Receita Federal, outro problema: o despachante descreveu a operação como sendo de “extração de moléculas para fabricação de medicamentos para combate ao câncer e a AIDS”', mas que a carga estaria apta a ser exportada.

No embarque, durante a inspeção para o certificado fitossanitário, o agente constatou que a ATPF que acompanhava a carga possuía tarja laranja e o IBAMA a autuou por exportar subproduto florestal sem licença válida (concedida pelo próprio órgão), dando início ao julgamento pela opinião pública e uma luta jurídica que duraria mais de 15 anos.

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