O domicílio do empregado como regra de fixação de competência territorial

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*LÁIZA RIBEIRO GONÇALVES

 

 

Resumo: Em Decisão datada de 11/12/2020, a SBDI-I do E. TST, firmou entendimento no sentido de que domicílio do empregado deve ser admitido como regra de fixação de competência territorial somente nas hipóteses em que seu empregador tiver atuação em âmbito nacional.

 

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Muito embora a CLT defina em seu artigo 651 como competência territorial para propositura da Reclamação Trabalhista o lugar da prestação de serviços pelo empregado ou o local de sua contratação, é habitual a prorrogação da competência territorial para o local do domicílio do empregado nos casos concretos, o que acaba por dificultar o exercício ao devido processo legal pelo empregador e, ainda, causar-lhes prejuízos financeiros.

 

É certo que a Legislação Celetista visa facilitar o amplo acesso à justiça pelo empregado (CF, art. 5º, XXXV), de forma que numa interpretação ampliativa do disposto no § 3º do artigo 651 da CLT,Juízes tem admitido o domicílio do autor como regra para fixação de competência territorial. Entretanto, essa flexibilização acerca da fixação da competência territorial há de ser ponderada, considerando que o acesso à justiça não pode se sobrepor a outras garantias fundamentais, como, por exemplo, a garantia ao devido processo legal, que é inerente aos litigantes.

 

Assim, não é prudente que o acesso à justiça pelo empregado, por si só, se sobreponha às regras objetivas de competência territorial fixadas na CLT, de forma a prejudicar o acesso ao devido processo legal e à ampla defesa do empregador. Sabemos que em não raros casos, o empregador, além de ter prejudicada a sua ampla defesa, acaba por suportar prejuízos materiais para se defender em demanda trabalhista proposta em local diverso da contratação do empregado ou da prestação de serviços.

 

Aliás, não é demais afirmar que inúmeros empregadores já optaram por firmar acordos com empregados antes mesmo da realização da audiência, apenas para diminuir os seus gastos financeiros em razão da locomoção de prepostos, testemunhas e contratação de advogados para a mesma. E ainda que a Reforma Trabalhista tenha viabilizado a presença de preposto não empregado, a presença de “qualquer pessoa”para representar o empregador numa audiência pode lhe acarretar ainda mais prejuízos, uma vez que o desconhecimento total dos fatos implica na sua confissão ficta.

 

Por essas razões, é que o acesso à justiça pelo empregado deve ser compatível com o direito de defesa do empregador, a fim de providenciar a maior igualdade processual possível entre as partes.

 

Em Decisão datada de 11/12/2020, a SBDI-I do E. TST, firmou entendimento no sentido de que no caso concreto, discute-se a aparente colisão de direitos fundamentais: de um lado, a garantia outorgada ao trabalhador de amplo acesso à Justiça (CF, art. 5º, XXXV); de outro, o direito assegurado aos réus ao contraditório e à ampla defesa, com os meios e recursos que lhe são inerentes (CF, art. 5º, LV), em consonância com o devido processo legal (CF, art. 5º, LIV).3. Buscando superar as situações em que a aplicação objetiva dos critérios fixados no art. 651 da CLT imponha o sacrifício de um dos princípios acima indicados, a jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho tem evoluído, buscando alcançar a teleologia das normas que fixam os critérios de competência no âmbito da Justiça do Trabalho. Nesse sentido, em face da necessidade de assegurar ao trabalhador o acesso à jurisdição, também garantindo ao reclamado o amplo exercício das faculdades de defesa, esta Corte assumiu a compreensão de que, em determinados casos, quando envolvida na disputa, empresa com atuação nacional, será razoável admitir o trânsito da ação no foro do domicílio do Autor, afastando-se a prevalência objetiva dos critériosestatuídos no art. 651 da CLT.”(RR-426-03.2017.5.20.0012, 5ª Turma, Relator Ministro Douglas Alencar Rodrigues, DEJT 11/12/2020).

 

Assim, temos que a jurisprudência do E. TST tem caminhado para admitir como flexibilização do disposto no artigo 651 da CLT e, consequentemente, local do domicílio do autor como regra de fixação de competência territorial, apenas nas hipóteses em que a empregadora tiver atuação em âmbito nacional, de forma a compatibilizar as garantias fundamentais do acesso à justiça e do devido processo legal e ampla defesa.

 

De outra sorte, considerando as inovações trazidas pelo NCPC, de aplicação subsidiária ao Processo do Trabalho, dentre elas o uso de videoconferência na prática de atos processuais, sobretudo para fins de produção de provas, é possível identificar a flexibilizaçãoda regra de fixação de competência territorial pela viabilidade, às empresas,do exercício ao devido processo legal e à ampla defesa através da oitiva de prepostos e testemunhas via carta precatória, o que não traria prejuízo às partes.

 

Em sendo a competência territorial fixada no foro do domicílio do autor e não tendo o empregador atuação em âmbito nacional, cabe a ele fazer uso da exceção de incompetência que, nos termos do artigo 800 da CLT, com redação dada pela Lei nº. 13.467/17, deve ser apresentada em até 05 (cinco) dias contados da sua notificação, sob pena de preclusão.

 

Por fim, sabemos que a Decisão que acolhe ou rejeita a exceção de incompetência é impugnável por recurso próprio, que é o Recurso Ordinário, após a prolação da Sentença, conforme disposto na Orientação Jurisprudencial 92 da SDI-II. Entretanto, inobstante a irrecorribilidade imediata das decisões interlocutórias, a SBDI-II já decidiu no sentido de que, em se tratando de decisão teratológica que afronte diretamente o texto expresso da lei, admite-se, excepcionalmente, o manejo do mandado de segurança.

 

Em outras palavras, se a competência territorial foi fixada em direta ofensa ao disposto no artigo 651 da CLT, sob o embasamento de ser o empregado hipossuficiente e para facilitar o seu acesso à Justiça, eventual mandado de segurança impetrado pelo empregador que não atue em âmbito nacional, deve ser admitido, flexibilizando, assim, a diretriz da OJ 92 da SBDI-II do TST.

 

Destarte, se o E. TST tem firmado entendimento no sentido de aplicar, com razoabilidade, a flexibilização da regra de fixação da competência territorial, nada mais justo de que o empregador faça uso da exceção, que é o meio adequado para arguição de tal matéria, a fim de ter resguardado o seu direito ao contraditório e à ampla defesa, bem como de diminuir os seus prejuízos econômicos em razão de uma demanda trabalhista ou, excepcionalmente, do mandado de segurança, em se tratando de decisão que afronte diretamente o disposto no artigo 651 da CLT.

 

 

 

*Advogada Trabalhista

Sócia do Escritório Brasil Salomão e Matthes

Coordenadora Trabalhista da Unidade Goiânia/GO

laiza.ribeiro@brasilsalomao.com.br